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Prevalência do negociado sobre o legislado: o que fazer

Antônio Augusto de Queiroz*

A Comissão Mista que tratou da MP 680, relativa ao Programa de Proteção ao Emprego (PPE), aprovou emenda ao texto prevendo a prevalência do negociado sobre o legislado, ou seja, só vale o que estiver na CLT se acordo ou convenção coletiva não dispuser em sentido diferente. A emenda, acatada pelo relator, deputado Daniel Vilela (PMDB-GO), e aprovada no colegiado é do deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS).

O texto, que será votado pelo plenário da Câmara e, se aprovado, pelo plenário do Senado, representará o maior retrocesso já havido nas relações de trabalho, porque flexibiliza e cria condições para precarizar os direitos dos trabalhadores, especialmente em momento de retração da atividade econômica.

A emenda incorporada ao Projeto de Lei de Conversão da MP 680 tem conteúdo equivalente ao do PL 5.483/01, da era FHC, que foi aprovado na Câmara por 264 votos a favor, 213 contrários e duas abstenções. Esse projeto chegou a tramitar no Senado, PLC 134/01, mas foi arquivado em face da aprovação da Mensagem 78/03, enviada ao Congresso pelo presidente Lula, que pedia a retirada de tramitação desse projeto de iniciativa do Poder Executivo.

O projeto de flexibilização da CLT, elaborado na gestão do ministro do Trabalho Francisco Dornelles (PP-RJ), durante o governo FHC, teve como relator na Câmara o ex-deputado e atual ministro do TCU, José Múcio Monteiro (PTB-PE). O então deputado e atual senador Paulo Paim (PT-RS), que lutou com todas as forças contra o projeto na Câmara, foi candidato ao Senado com o propósito de barrar a tramitação da matéria lá na Câmara Alta.

Passados 14 anos, por iniciativa de deputados vinculados à bancada empresarial, o pesadelo da flexibilização da CLT volta à cena, e desta vez numa manobra escandalosa. A emenda que institui, em caráter permanente, a prevalência do negociado sobre o legislado, se dá numa medida provisória que trata de um programa temporário de combate ao desemprego, com prazo máximo de duração de dois anos.

Quanto à emenda, registre-se que todas as centrais foram contrárias à sua aprovação e que também houve manifestação contrária da então Secretaria-Geral da Presidência da República, embora o Ministério do Trabalho e Emprego tenha sido completamente omisso nesse processo. Apesar disto, o texto foi aprovado por 12 votos a oito, conforme segue:

A favor dos trabalhadores e contra a emenda

A favor da emenda e contra os trabalhadores

Senador Hélio José (PSD-DF)

Senador Dário Berger (PMDB-SC)

Senador Humberto Costa (PT-PE)

Senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA)

Senador José Pimentel (PT-CE)

Senador Dalírio Beber (PSDB-SC)

Senador Paulo Rocha (PT-PA)

Senador Antônio Anastasia (PSDB-MG)

Senadora Regina Sousa (PT-PI)

Senador Sérgio Petecão (PSD-AC)

Deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA)

Deputado  Renato Mollling (PP-RS)

Deputado Afonso Florence (PT-BA)

Deputado Daniel Vilela (PMDB-GO)

Deputado Vicentinho (PT-SP)

Deputado Jorge Côrte Real (PTB-PE)

                                            –

Manoel Júnior (PMDB-PB)

                                            –

Deputado Wellington Roberto (PR-PB)

                                            –

Deputado Alexandre Leite (DEM-SP)

                                            –

Deputado Rocha (PSDB-AC)

Feita esta contextualização histórica e informado os personagens envolvidos, vamos ao que fazer para evitar que essa tentativa de agressão ao Direito do Trabalho no país não se transforme em norma jurídica.

O primeiro a fazer é apresentar um recurso ao presidente da Câmara para considerar não escrito a parte do parecer que incorpora a emenda, já que se trata claramente de contrabando, uma vez que a MP trata de um programa temporário, de apenas dois anos de duração, e a emenda tem caráter permanente.

A segunda ação, inviabilizada a primeira hipótese, é apresentar destaque para a votação separado, excluindo do projeto de lei de conversão os artigos 11 e 12, que resultaram da referida emenda. Apresentado o destaque, o texto precisa ser aprovado por maioria simples para ser considerado aprovado. Para clareza do que está em debate, reproduzimos a seguir a íntegra dos artigos 11 e 12, com a íntegra da emenda que institui a prevalência do negociado sobre o legislado:

“Art. 11. O art. 611 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos:

“Art. 611…………………………………………………………………..

§3º As condições de trabalho ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho prevalecem sobre o disposto em lei, desde que não contrariem ou inviabilizem direitos previstos na Constituição Federal, nas convenções da Organização Internacional do Trabalho – OIT, ratificadas pelo Brasil, e as normas de higiene, saúde e segurança do trabalho.

§4º Para o efeito previsto no caput deste artigo, deve ser ampla a divulgação da assembleia geral que autorize a celebração de convenção ou acordo coletivo, garantida a participação e o voto de todos os interessados.

Art. 12. A prevalência das convenções e acordos coletivos trabalhistas sobre as disposições legais, consoante a redação dada pelo art. 11 ao art. 611 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, aplica-se somente aos instrumentos negociais coletivos posteriores à publicação desta Lei e não prejudica a execução daqueles em andamento e os direitos adquiridos em razão da lei, de contrato ou de convenções e acordos coletivos anteriores”.

O terceiro ato, caso não seja possível reverter na Câmara, é atuar fortemente sobre os senadores para que rejeita a referida emenda. A quarta e última ação, caso o texto seja aprovado conclusivamente pelo Congresso, é trabalhar o veto presidencial aos artigos 11 e 12 do Projeto de Lei de Conversão, como forma de preservar o Programa de Proteção ao Emprego, porém sem precarizar, de modo permanente, as relações de trabalho.

Há, portanto, muito que fazer. O movimento sindical deve concentrar todos os seus esforços na luta para evitar esse retrocesso, que é infinitamente maior do que o mal da terceirização. De qualquer modo, se não for possível derrotar a emenda no Congresso, a presidente Dilma tem a obrigação moral de vetar os artigos que flexibilizam a CLT e tornam letra morta o Direito do Trabalho. Mãos à obra.

(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap

CNTS

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