Ministro relator vota pela validade da desaposentação

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, relator do Recurso Extraordinário (RE) nº 661256, que discute a desaposentação, votou pelo provimento parcial do recurso no sentido de considerar válido o instituto. O relator considerou válida a possiblidade da desaposentação, mas condicionou o recálculo dos benefícios levando em conta os proventos já recebidos pelo interessado. Assinalou também que, no cálculo do novo benefício, os itens idade e expectativa de vida do fator previdenciário devem ser idênticos aos aferidos no momento da aquisição da primeira aposentadoria. De acordo com ministro, essa orientação deve ser aplicada 180 dias após publicação do acórdão do Supremo, desde que os Poderes Legislativo e Executivo não regulamentem a matéria, com premissas compatíveis com a decisão da Corte.

Em seu entendimento, a legislação é omissa em relação ao tema, não havendo qualquer proibição expressa a que um aposentado do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que tenha continuado a trabalhar pleiteie novo benefício, levando em consideração as novas contribuições. A matéria teve repercussão geral reconhecida. “Inexistem fundamentos legais válidos que impeçam a renúncia à aposentadoria concedida pelo Regime Geral para o fim de requerer um novo benefício, mais vantajoso, tendo em conta contribuições obrigatórias efetuadas em razão de atividade de trabalho realizada após o primeiro vínculo”, argumentou.

O relator afirmou que, como o RGPS constitui um sistema fundamentado na contribuição e na solidariedade, não é justo que um aposentado que, voltando a trabalhar, não possa usufruir das novas contribuições. Segundo ele, mantida essa lógica, deixa de haver isonomia entre o aposentado que retornou ao mercado de trabalho e o trabalhador na ativa, embora a contribuição previdenciária incida sobre os proventos de ambos da mesma forma.

O ministro considerou que vedar a desaposentação sem que haja previsão legal seria o mesmo que obrigar o trabalhador a contribuir sem ter a perspectiva de benefício posterior, o que, segundo seu entendimento, é incompatível com a Constituição. Segundo ele, a Lei 8.213/1991, ao garantir ao aposentado que volta ao mercado de trabalho direito apenas à reabilitação profissional e ao salário-família não significa proibição de renúncia à aposentadoria inicial para a obtenção de novo benefício. “Tem que haver uma correspondência mínima entre contribuição e benefício, sob pena de se anular o caráter contributivo do sistema. O legislador não pode estabelecer contribuição vinculada e não oferecer qualquer benefício em troca”, sustentou.

Com o objetivo de preservar o equilíbrio atuarial do RGPS, o ministro propôs que o cálculo do novo benefício leve em consideração os proventos já recebidos pelo segurado. De acordo com sua proposta, no cálculo do novo benefício, os elementos idade e expectativa de vida, utilizados no cálculo do fator previdenciário – um redutor do valor do benefício para desestimular aposentadorias precoces –, devem ser idênticos aos aferidos no momento da aquisição da primeira aposentadoria, sob pena de burla ao sistema. Para o ministro, essa solução é a mais justa, pois o segurado não contribui em vão. Salientou também que essa fórmula é a mais apta para preservar o equilíbrio atuarial do sistema.

Após o voto do relator, o julgamento foi suspenso para que a questão seja discutida com o Plenário completo. De acordo com o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, pela relevância, o tema deverá ser analisado com o quórum completo da Corte. Na sessão de 8 de outubro, três ministros encontravam-se ausentes, justificadamente.

Contrários – Com as sustentações orais dos representes do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da Advocacia-Geral da União (AGU), contrários à chamada desaposentação, o plenário do STF retomou, no dia 9, o julgamento dos Recursos Extraordinários (REs) 661256 e 827833. Nesses casos, os ministros devem decidir se é permitida a conversão da aposentadoria proporcional em aposentadoria integral, pela renúncia ao primeiro benefício e o recálculo das contribuições recolhidas após a primeira jubilação.

No caso concreto, autor do recurso, o INSS questiona decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que reconheceu a um segurado aposentado o direito de renunciar à sua aposentadoria com o objetivo de obter benefício mais vantajoso, sem que para isso tivesse que devolver os valores já recebidos. O representante do INSS, Marcelo Siqueira Freitas, questionou a ausência de fonte de custeio para sustentar a chamada desaposentação. Isso porque o sistema previdenciário brasileiro funciona à base da repartição simples e da solidariedade, e não da capitalização. O procurador ressaltou que o beneficiário contribui para suportar os benefícios para a geração que não está mais em atividade, e usufrui do benefício. Ele não está capitalizando seu próprio benefício.

Nesse sentido, Freitas explicou que se um contribuinte trabalha por um ano e um dia, e se aposenta por invalidez, ele vai receber seu benefício pelo tempo que for preciso, mesmo que praticamente não tenha contribuído para o sistema, exatamente porque a previdência funciona a partir do conceito de solidariedade. Para o procurador da autarquia federal, não se pode falar em renúncia à aposentadoria. Segundo ele, seria uma renúncia simulada, já que o objetivo é ter benefício majorado através da contagem das contribuições que verteu depois de ter recebido o primeiro benefício. Mas sem devolver o que recebeu antes do pedido da nova aposentadoria.

O artigo 201 parágrafo 4º da Constituição Federal assegura o reajustamento dos benefícios para preservar, em caráter permanente, o valor real. Qualquer coisa além disso viola a Constituição, concluiu o procurador, revelando que existem mais de 123 mil processos judiciais em todo o país sobre esse tema.

O advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, disse entender que a questão nuclear, nesse modelo de regime de previdência, é a sustentabilidade baseada na solidariedade de toda sociedade. Tanto é assim que até mesmo os aposentados contribuem, uma vez que são corresponsáveis pelo sistema, que atende toda sociedade. Ele repetiu o que disse o procurador, no sentido de que o sistema não é patrimonial ou pessoal.

É imposto à toda sociedade, para poder sustentar o sistema. É com esse sistema que o Estado consegue atingir o objetivo central da República, disse, lembrando que a previdência não cuida só de aposentadorias, mas de invalidez, morte, maternidade, seguro-desemprego, aposentadoria da dona de casa. Quem se aposentou mais cedo, para usufruir dos benefícios, não pode agora, mediante suposta renúncia, pretender quebrar a lógica do sistema, concluiu o advogado, que considerou fundamental que se mantenha o sistema da forma que está.

Amici curiae – Admitidos como parceiros no Recurso Extraordinário (RE) 661256, com repercussão geral reconhecida, representantes do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) e da Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Copab) expuseram seus argumentos favoráveis à desaposentação. Os advogados das entidades se manifestaram a favor da validade do instituto.

Em nome do IBDP, a advogada Gisele Kravchynchyn ressaltou que a desaposentação consiste em troca de benefício, e não na revisão de um benefício com a manutenção de outro. “Trata-se da renúncia de um direito adquirido para o exercício de outro direito adquirido. Ambos protegidos constitucionalmente e legalmente”, assinalou, afirmando que “não há na Carta Magna nenhuma vedação à renúncia e à troca desse benefício”. Além disso, destacou que, conforme o artigo 18 da Lei 8.213/1991, é vedado ao aposentado apenas o acúmulo de benefícios.

O representante da Cobap, Gabriel Marcolin, defendeu a desaposentação como necessária, pois “corrige o famigerado fator previdenciário, pelo qual quanto mais a pessoa trabalha, menor pode ser o benefício”. Ressaltou, ainda, que a Lei de Diretrizes Orçamentárias prevê a destinação de verbas para o pagamento da desaposentação. (Fonte: STF)

CNTS

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