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Constituição completa 29 anos em meio a retrocessos

Esta quinta-feira, 5, marca os 29 anos da promulgação da Constituição Federal de 1988. Chamada pelo presidente da Assembleia Nacional Constituinte, o ex-deputado federal Ulysses Guimarães, de “Constituição Cidadã”, por representar o sepultamento da ditadura militar e assegurar direitos sociais, trabalhistas e previdenciários, porém, hoje ainda carece de regulamentação de alguns dispositivos e sofre com ataques às garantias estabelecidas.

Naquele momento, portanto, a Carta de 1988 significou a ideia de rompimento com o passado a fim de estabelecer um novo horizonte nas relações humanas marcando o nascimento do Estado Democrático de Direito. A adoção de valores fundamentais como a dignidade da pessoa humana; a garantia de uma sociedade livre, justa e solidária; a erradicação da pobreza e da marginalização; a redução das desigualdades sociais e regionais; a resolução pacífica dos conflitos; a garantia de acesso à Justiça; a valorização do trabalho humano, da família, da criança e do adolescente, dos indígenas, das minorias, a proteção do meio ambiente, enfim, naquele momento foram consagrados princípios progressistas para servir como parâmetros para que as regras jurídicas sempre fossem interpretadas sem que se perdesse de vista o ser humano.

Foi a Constituição que instituiu o seguro desemprego e diversas garantias para a classe trabalhadora, sob ameaças da Lei 13.467/17. Também foi instituído o Sistema Único de Saúde – SUS, cuja atuação não se restringe ao atendimento de doentes, mas abarca também a prevenção e controle de doenças, por meio de vacinações e outras ações populacionais, acesso a medicamentos essenciais, atuação rotineira da vigilância sanitária, atendimentos ambulatoriais abrangendo uma vasta gama de modalidades assistenciais, incluindo saúde bucal e saúde mental, saúde da família, serviços de urgência e emergência e até mesmo transplantes. Mesmo sendo modelo para outros países por ser o maior serviço de saúde pública do mundo, o SUS é permanentemente vítima de ataques de setores da sociedade interessados em desconfigurar as propostas contidas na Carta de 1988. A finalidade destas intervenções é entregar ao setor privado o atendimento em saúde por meio da terceirização dos serviços.

Nessas quase três décadas de existência, a Constituição Cidadã agonizou e encontra-se desrespeitada em sua magnitude. Por vezes, é ridicularizada injustamente por aqueles mais deveriam defender o texto constitucional. As recentes atuações do Supremo Tribunal Federal, do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional mostram que os valores e princípios sobre os quais a Constituição da República foi construída foram esquecidos.

Entre os atuais retrocessos sociais e trabalhistas que causam impactos na vida de milhões de brasileiros estão, a terceirização, o negociado sobre o legislado, a flexibilização da jornada de trabalho, contingenciamentos nos recursos da saúde e educação e o estrangulamento da Justiça do Trabalho. Isso sem contar as propostas em curso no Congresso Nacional da reforma da Previdência, ao estabelecer uma idade mínima para aposentadoria, que hoje não existe no Brasil, e diminuir potencialmente o valor dos benefícios, com uma fórmula de cálculo que exige 40 anos de contribuição para a aposentadoria integral. Ou mesmo alterações nas políticas públicas de repasse de renda ou de proteção à infância e adolescência, que acabaria facilitando o aumento de casos de trabalho infantil.

O STF, órgão que deveria ser o guardião da Constituição, tem mitigado princípios específicos e preciosos ao direito do trabalho sedimentados desde o século XIX e consagrados pela Constituição Federal em seu artigo 7º cuja essência é sempre a melhoria da condição social do trabalhador. Assim, a Corte julgou pela prevalência do negociado sobre o legislado, admitindo a supressão de direitos; restringiu de modo irreparável o direito de greve; suspendeu a vigência da Portaria n. 2, de 2011 do MTE, referente à lista do trabalho escravo; reduziu o prazo prescricional do FGTS de trinta para cinco anos, confundindo a natureza do instituto em questão; validou a Lei 11.201/2009, que prevê jornada de 12 horas diárias para o bombeiro civil, o que excede o limite legal e constitucional previsto; avalizou a terceirização em atividades meio e fim, quando decidiu que o poder público pode terceirizar seus serviços sociais por meio da contratação de organizações sociais de natureza privada e chancelou o esfacelamento da Justiça do Trabalho em virtude de grave corte orçamentário.

Os exemplos não esgotam os retrocessos que estão por vir. Num país onde não se respeita a Constituição Federal, os três poderes se transformam numa espécie de vale tudo. Por isso, o discurso de Ulysses Guimarães, na data da promulgação, se mostra profético ao afirmar que “a persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia. Quando, após tantos anos de lutas e sacrifícios, promulgamos o estatuto do homem, da liberdade e da democracia, bradamos por imposição de sua honra: temos ódio à ditadura. Ódio e nojo”.

Leis Faltantes – Um levantamento recente feito no Congresso Nacional identificou 112 leis mencionadas explicitamente no texto constitucional que deveriam ter sido criadas, mas até hoje não foram. No meio jurídico, as normas inexistentes são conhecidas como “leis faltantes”. Entre elas estão as regulamentações para greve de servidores públicos, crime de terrorismo, licença paternidade, trabalho escravo e negociação coletiva no serviço público.

O direito dos trabalhadores de cruzar os braços é uma tradição de países democráticos e aqui no Brasil está garantido pela Constituição, no seu artigo nono. Mas há limites. Uma lei de 1989 impõe condições para greves do setor privado. A greve tem de ser aprovada por uma assembleia. No caso dos servidores públicos, a lei que iria impor limites para greves está prevista na Constituição, mas nunca foi criada.

Na falta da lei, o Supremo Tribunal Federal decidiu que os servidores públicos devem obedecer à lei de greve dos trabalhadores das empresas privadas. Mas nem todos os funcionários públicos têm direito de greve. A Constituição proíbe expressamente greves em atividades essenciais, como saúde, de militares e de Policiais Militares. Quanto aos integrantes das polícias civis e federal, há um entendimento do Supremo Tribunal Federal de que eles também não podem fazer greve. 

Em relação à negociação coletiva, a Câmara dos Deputados aprovou em setembro o Projeto de Lei 3831/15, que estabelece normas para a negociação coletiva no serviço público da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. O PL estabelece que podem ser tratados na negociação temas como plano de carreira, remuneração, condições de trabalho, planos de saúde, estabilidade e avaliação de desempenho, aposentadoria e demais benefícios previdenciários. O PL teve origem no Senado e foi aprovado em caráter conclusivo na CCJ da Câmara, se não houver recurso para ir à plenário, seguirá para sanção presidencial. (Com Carta Capital, G1, Agência Brasil, Folha de São Paulo e UOL)

 

 






CNTS

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