Audiência pública no Senado repudia PL da terceirização

O espaço do auditório Petrônio Portela, do Senado Federal, foi pequeno para a manifestação dos trabalhadores e representantes de movimentos sociais contra o PL 4.330/04, que a pretexto de regulamentar o trabalho terceirizado empurra toda a classe trabalhadora para a vala comum da precarização da mão de obra no país. Os mais de 400 lugares foram logo ocupados, enquanto uma centena de pessoas aguardava a liberação na portaria, que só veio após apelo do senador Paulo Paim para que a segurança da Casa permitisse a entrada. Outras cem pessoas acompanharam a audiência pública no plenário da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), por meio da transmissão ao vivo pela TV Senado. Enquanto os trabalhadores gritavam palavras de ordem – Não, não, não à terceirização – dirigentes sindicais e parlamentares se revezavam nos discursos contrários à proposta, que tramita no Senado como PLC 30/15.

A audiência foi requerida por Paulo Paim (PT-RS), presidente da CDH, que acatou pedido das confederações que compõem o Fórum Sindical dos Trabalhadores – FST, entre elas a CNTS, e das centrais sindicais. As maiores entidades representativas dos trabalhadores se fizeram presentes e condenaram a proposta aprovada pela Câmara dos Deputados. Por unanimidade, os dirigentes compararam a terceirização a uma situação análoga à escravidão, confirmando o tema da audiência – A Lei Áurea, a terceirização e o combate ao trabalho escravo – evento realizado em 13 de maio, justamente no dia em que se completaram 127 anos da abolição da escravatura. E convocaram paralização geral dia 29 de maio, em repúdio ao projeto.

Paim recebeu das centrais sindicais, dos acadêmicos e juristas, propostas alternativas ao PLC 30. “Nosso principal objetivo é derrubar a proposta, mas, se não for possível, as sugestões vão subsidiar o substitutivo que vou apresentar na Comissão”, disse o senador.

A audiência teve início com a apresentação do documentário Vovó Leontina, sobre a luta contra o racismo, do historiador Pedro Paulo Pinto da Rosa. “Não queremos, para ninguém, a volta da escravidão. E é isso que representa o projeto da terceirização”, ressaltou Paim na abertura da audiência. Paim lembrou que pesquisas de opinião mostram que cerca de 90% da população é contrária à proposta. O senador vê que o Ministério do Trabalho não terá condições de fiscalizar as situações análogas à escravidão se a proposta for aprovada como está. “Cerca de 80% dos casos de acidentes no trabalho envolvem terceirizados. Quem tem compromisso com a classe trabalhadora não pode apoiar isso”.

O presidente do Senado e do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), repetiu à plenária o que tem dito em entrevistas e anunciou ter convocado uma sessão temática para o próximo dia 19, no plenário do Senado, aberta para a participação da sociedade. Calheiros deixou claro que o Senado não deverá trabalhar com a mesma filosofia da proposta como ela foi votada pela Câmara, liberando a terceirização nas atividades-fim das empresas. “Nosso papel aqui será regulamentar pra quem já é terceirizado. Não vamos transformar os outros 40 milhões de trabalhadores em terceirizados também, não podemos praticar este “liberou-geral”. Precisamos tirar a terceirização da zona cinzenta em que se encontra, mas sem revogar qualquer direito dos trabalhadores”, defendeu.

Em seguida, Renan Calheiros almoçou com o ex-presidente da República Luis Inácio Lula da Silva e, na ocasião, reiterou que defende a regulamentação dos 13 milhões de trabalhadores terceirizados que já estão no mercado de trabalho, mas manifestou preocupação com a criação de um novo modelo de desenvolvimento econômico que venha a retirar direitos trabalhistas. “Defendi a necessidade de modernizar nossa economia e acho que tem que regulamentar os terceirizados existentes, mas não podemos precarizar outros 40 milhões de trabalhadores. O Legislativo pode, sim, regulamentar a terceirização da atividade fim, mas essa é uma nova opção de desenvolvimento para o Brasil. Uma opção que precariza as relações de trabalho, revoga a CLT e a CLT não pode ser revogada assim”, afirmou Renan.

O senador Telmário Mota (PDT-RR) também teceu duras críticas ao texto aprovado na Câmara. “Liberar a terceirização para as atividades-fim é retornar à escravidão. Forças poderosas estão por trás desta iniciativa, a sociedade precisa estar atenta”. “É lamentável que a terceirização avance segundo os argumentos dos empresários da competitividade. Contem comigo contra esta proposta”. Mota disse que Paim é o orgulho do Senado, por sua deferência em defesa das classes mais humildes. E ressaltou o trabalho dos fiscais “quebrando barreiras para defender o Estado e fazendo a lei acontecer”.

“Fico feliz em ver este plenário lotado de esperança e disposição para a luta”, disse a senadora Fátima Bezerra (PT-RN), convocando a mobilização em função dos ataques aos direitos dos trabalhadores. “Após 120 anos a abolição ainda não se realizou plenamente. Falar de escravidão é falar desse famigerado PL 4.330”. Ela anunciou que o partido fechou posição contra a proposta e destacou os tempos difíceis atuais. “O Congresso está avançando em seu perfil conservador. Isso se reflete na aprovação deste projeto, na diminuição da idade penal, e até mesmo na forma como vem sendo conduzida a reforma política, quando devíamos estar votando a taxação das grandes fortunas e heranças, a redução da jornada, o fim do fator previdenciário. Vocês tem força, fé e esperança para lutar e vencer”.

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) propôs que o Senado se transforme “numa trincheira” contra o PLC 30/15 e chamou de “pelegas” as centrais sindicais que o apoiam. “Não passarão. É uma mentira, uma falácia dizer que este texto como está cria direitos”, afirmou.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) classificou como cruel e desumana a forma que o PL 30/15 trata as questões trabalhistas. “Este famigerado projeto quer terceirizar a atividade-fim e precarizar as relações de trabalho. Os que aprovaram este projeto na Câmara dizem que este projeto é uma forma de trabalho moderna. O que há de modernidade nisto? Não há modernidade numa terceirização que faz com que os trabalhadores tenham em média uma jornada de três horas por dia superior aos empregados da empresa contratante. 90% dos trabalhadores que foram resgatados de situações análogas à escravidão eram terceirizados. Não há dignidade para estes trabalhadores que ganham 27% a menos que os empregados contratados”, disse.

Para o secretário de Inspeção do Trabalho do MTE, Paulo Sérgio de Almeida, a terceirização proposta provoca sérios danos ao mercado de trabalho e aos trabalhadores. “Sabemos os malefícios da terceirização sem controle. O cenário será este: uma empresa que contrata outra empresa, que subcontrata uma microempresa, que contrata um empreendedor individual, que contratará por fim um trabalhador. Este último receberá um salário irrisório e sofrerá pressões de todos os lados, tendo como resultado uma relação de trabalho análoga à escravidão. Gostaríamos de aproveitar esta audiência e pedir ao STF que autorize a liberação da lista dos empregadores que se utilizam da prática de trabalho escravo”.  

CNTS

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